Jorge Amado - Farda, Fardão, Camisola de Dormir

Literatura brasileira
Jorge Amado - Farda, Fardão, Camisola de Dormir - 272 Páginas - Editora Companhia das Letras - Relançamento: 18/09/2009.

Jorge Amado (1912-2001) nunca foi devidamente reconhecido por grande parte da crítica literária brasileira, talvez devido ao sucesso de público de seus romances ou em decorrência das adaptações para cinema, teatro e televisão, mas isso só comprova que a aceitação popular não é sempre incompatível com o valor artístico, a sua obra é atemporal e universal, como todo grande autor deve ser. Entre seus muitos romances, "Farda, Fardão, Camisola de Dormir", lançado originalmente em 1979, é ignorado na maioria das compilações bibliográficas sobre autor e, de fato está longe de ser o melhor livro de Jorge Amado, contudo, algumas peculiaridades merecem reflexão se considerarmos o momento histórico atual do Brasil e do mundo, uma época em que as ideologias de extrema direita e um apelo ao nacionalismo e xenofobia ameaçam as liberdades individuais.

Em 1940, o Estado Novo, instituído por Getúlio Vargas em 1937, mostrava perigosos sinais de simpatia com o avanço do regime nazista na Europa e mantinha um governo de forte repressão política no Brasil que duraria até janeiro de 1946, uma fase de obscurantismo na história nacional e mundial. O próprio Jorge Amado, militante comunista, foi obrigado a exilar-se na Argentina e no Uruguai entre 1941 e 1942, período em que fez longa viagem pela América Latina. Em 1945, foi eleito membro da Assembléia Nacional Constituinte, na legenda do Partido Comunista Brasileiro (PCB), tendo sido o deputado federal mais votado do Estado de São Paulo. A sua trilogia "Os Subterrâneos da Liberdade" retrata episódios ocorridos durante o Estado Novo (1937-45) e a resistência do Partido Comunista Brasileiro durante o período, tendo sido escrita em Praga, na Checoslováquia, onde ele viveu depois de ter sido exilado, em 1948.

Os anos quarenta foram portanto uma época bastante conturbada da política brasileira, particularmente difícil para Jorge Amado, mas a recriação ficcional deste período em "Farda, Fardão, Camisola de Dormir", tem uma abordagem muito mais leve do que em "Os Subterrâneos da Liberdade". Escrito bem mais tarde, em 1979, durante o final de outro regime de exceção militar (1964-1985), com o subtítulo de "Fábula para acender uma esperança", o romance mistura personagens ficcionais e históricos em sua narrativa para descrever a disputa de uma vaga na Academia Brasileira de Letras. Após a morte do poeta Antônio Bruno, o coronel Sampaio Pereira, chefe da repressão política do regime e simpatizante do nazismo se candidata à vaga na Academia, ocorrendo então um movimento entre alguns veteranos acadêmicos contra a sua candidatura.
"Esta fábula conta como dois velhos literatos, acadêmicos e liberais, partiram em guerra contra o nazismo, a ditadura e a prepotência. Toda e qualquer semelhança com tipos, organizações, academias, classes e castas, figuras e sucessos da vida real será pura e simples coincidência, pois a anedota é produto exclusivo da imaginação e da experiência do autor. Reais são apenas a ditadura do Estado Novo com a Lei de Segurança, a máquina de repressão, as prisões cheias, as câmaras de tortura e o obscurantismo, e a Segunda Grande Guerra Mundial, desencadeada pelo nazifascismo, em seu pior momento, quando se dava tudo por perdido e a esperança fenecia." - Introdução (Pág. 13)
Jorge Amado, ele próprio eleito para a ABL em 1961, utilizou muito de sua experiência na instituição literária para mostrar o mundo de formalidades que envolvia as eleições e seus procedimentos secretos. No romance, a saída encontrada para fazer frente à candidatura do coronel Sampaio Pereira, que representava o regime autoritário da época, foi articular a anticandidatura de outro militar, de oposição, o general reformado Waldomiro Moreira. As divertidas estratégias utilizadas na campanha dos dois candidatos, que refletiam a senilidade de muitos dos quarenta acadêmicos, dão um tom bem-humorado e irônico ao romance, uma grande sátira sobre a vaidade humana.

A narrativa é totalmente ambientada na cidade do Rio de Janeiro, uma exceção à apaixonada tradição do autor de caráter regionalista que imortalizou com seus inúmeros personagens inspirados no povo simples da Bahia e suas tradições folclóricas e religiosas, sempre com muita sensualidade. Por sinal, mesmo com personagens eruditos e de avançada idade, Jorge Amado encontra espaço para descrever as apimentadas relações amorosas do falecido poeta Antônio Bruno, um sucesso com as mulheres da sociedade carioca da época. Enfim, um livro leve e agradável de se ler, com  a marca do estilo único do autor que sabe como poucos contar uma boa história.

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